A simplicidade da música não escondia, no entanto, os propósitos daquela gente. Chegavam saudando, respeitosamente, as entidades carnavalescas mais antigas da cultura popular negra baiana como Gandhy, Ilê e Badauê. Porém, também clamavam estar na festa, em plena avenida, como portadores das tradições e simbologias afrodescendentes. Chamavam o povo para se apresentar, afirmando ser o bloco negro Malê Debalê. Todos na rua ficaram contagiados com a alegria e a garra do grupo. Naquele primeiro ano, foi o campeão, na categoria das entidades afros, no concurso, então promovido pelo governo municipal. O e consolidação do grupo.
O Malê aparece, tendo a frente de seu desfile uma ala de dança organizada, ensaiada e coreografada por um de seus componentes, o dançarino conhecido pelo nome artístico de Formigão, hoje o mais antigo integrante do elenco do Ballet Folclórico da Bahia. A dança personalizou o Malê Debalê e lhe deu notoriedade. É reconhecidamente identificada por sua força e vigor, a tal ponto que o jornal The New York Times, conferiulhe
o título de “O maior Ballet Afro do Mundo”.
Provavelmente o elemento mais representativo de todo o processo do grupo é o próprio símbolo do Malê. Ao fundo está desenhada uma meia-lua. Ocupando o centro do símbolo, incrustado na lua, um polígono estrelado regular de seis pontas, conhecido como o signo de David. Certamente, a intenção era representar a estrela de Salomão, de cinco pontas, reverenciando a mandinga dos malês, que colocavam esta estrela, em cima de um mantra, guardado num patuá que traziam no pescoço, para se resguardarem de olhados e bruxarias. Porém, o desconhecimento da diferença resultou no equívoco de representar, através da estrela de David, a crença vinculada à estrela de Salomão. Enfim, em cada ponta dessa estrela, desenhada no símbolo do Malê Debalê, aparece um búzio ou um peixe. Ao centro, destaca-se a figura da negra malê.
Esse sentimento de pertencer possibilita, também, diferenciar uma comunidade – no caso do Malê, um bloco afro – da genérica categoria de um grupo étnico. O pertencimento responde pela unificação dos esforços individuais em defesa dos interesses comuns que, na maioria das vezes, são desprezados pela sociedade, porque não constituem uma verdade universal e projetiva, mas saberes localizados e, na maioria das vezes, imediatistas. A preocupação do grupo é o presente vivido coletivamente através de relações de sintonia.
O bloco Afro Malê Debalê foi fundado em 23 de março de 1979 por um grupo de familiares, amigos e vizinhos moradores do bairro popular de Itapuã, situado no litoral norte da cidade do Salvador-Bahia. O cotidiano partilhado na mesma localidade, o respirar coletivo de sua gente na mesma ambiência e o conviver com os dramas e as delícias do dia-a-dia foram os responsáveis pelo surgimento e consolidação do grupo.
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